10.6.14

HISTÓRIAS DE ANINHA - Dona Graciosa




Na década de 50 vivia na fronteira com a Bolívia, na cidade São Luiz de Cáceres Dona Graciosa  professora de História do Colegial na Escola Pública. Tinha uma estrutura forte, era alta e uns quilos a mais. Diziam seus alunos que era muito competente no que lecionava. Era  pianista clássica mas apreciava muito as músicas populares como a italiana o Sole Mio e a brasileira Pombinha – “ lua, quando amanhece o dia no meu rincão...”. Quando eu  a via na rua, era sempre de uma elegância inquestionável: roupas, sapatos e bolsas, tudo combinando, oriundos do Rio de Janeiro. Cabelo penteado em um coque perfeito.

Dona Graciosa era carioca, a família de seus pais – falecidos - morava toda no  Rio de Janeiro, naquela época, capital do País.

D. Graciosa, conheceu o General Alfem no  Rio de Janeiro. Foi amor à primeira vista e se casaram. O Gal. Alfem, era  viúvo e morava em Cáceres.

O general Alfem do seu primeiro casamento tinha 4 filhas, casadas com senhores riquíssimos, pecuaristas no Pantanal e produtores de cana-de-açucar e que moravam em mansões lindíssimas, em São Luiz de  Cáceres.

O general  Alfem , levou D. Graciosa para Cáceres e   moravam numa casa grande, antiga, com grande quintal,  no centro da  cidade onde se congregava a elite social. Tiveram uma única filha, moça feita que  estudava   no Rio de Janeiro.
O general   sofreu um AVC e faleceu.  Dona Graciosa ficou sozinha e  alternava as férias escolares, ora ela indo ao Rio de Janeiro, ora a filha vindo a casa dela.

A casa de D.  Graciosa era vizinha da casa do Engenheiro Dr. Armando e D. Diva, onde morávamos, após a minha mãe ficar viúva e prestava serviços de jardineira. Morávamos  numa casinha  composta de  2 quartos, varanda, cozinha e banheiro.

 Havia ali uma área  imensa do tamanho de um campo de futebol e um pomar rico com goiabeiras, laranjeiras, lima de umbigo,  ata ou  fruta de conde,  era como se fosse um pequeno sítio para mim. Mas o terreno era protegido por um muro alto.

 Meu irmão e eu, estávamos na idade de frequentar a Escola e nós estudávamos na parte da manhã e na parte da tarde após fazer o dever, ajudávamos a mamãe a regar as plantas no jardim e brincávamos de tudo ,com as crianças da vizinhança... Como era bom  !!!

A tardinha, D. Graciosa tocava ao piano “O sole mio”, “Pombinha”...,  e eu me deleitava com o som melodioso que escutava na varanda, em minha casa.

Como eu disse, o muro que dividia as casas era alto. Próximo ao muro, existia um pé de manga rosa deliciosa e  eu, na curiosidade infantil de meus 7 anos, um dia,  subi nela para espiar a casa da vizinha cantante.
 
Fiquei perplexa com o que vi... D. Graciosa vivia em meio a uma sujeira de espantar qualquer um que gostasse de um mínimo de organização e limpeza.

Ela criava no quintal: galinhas, pintinhos, galos, patos e porcos... e a cozinha e copa, era a continuidade de seu quintal, onde os animais entravam e saiam na maior liberdade.



Eu vi em cima do Piano,  em uma sala contígua à cozinha, pratos com sobras de comida onde os galos e galinhas subiam e comiam com avidez. 




Os porcos, vinham disputar as   migalhas que caiam no chão.



Cáceres, fica às margens do rio Paraguai e é muito quente.  A temperatura oscila entre 30 e 40° C, à sombra.

Com tanto calor, aliada à obesidade da D. Graciosa, percebi que ela estava usando uma anágua de tecido de algodão transparente. Os seus seios, livres de soutien, estavam   a mostra e esparramavam-se sobre a sua grande barriga fofa e protuberante...

Ao vê-la daquele jeito  fiquei estarrecida porque a D. Graciosa que eu via na rua com tanta elegância, se desnudava em sua casa e se transformava em uma pessoa diferente daquela que se apresentava nas ruas: sempre,  elegante e sóbria.

D. Graciosa, era uma mulher feliz, além de tocar piano, cantava ... Com a filha bem encaminhada  na vida, ela, exercia sua profissão, e vivia  em sua casa com toda liberdade, sem ter ninguém para dar satisfações de seus atos e assim prosseguia...

A filha de D. Graciosa ia se casar com um carioca e o casamento seria realizado na casa dela. Como as enteadas de D. Graciosa conheciam a casa da madrasta, e preocupadas com a situação domiciliar dela, resolveram de comum acordo promover uma Reforma na  casa ,  arcando elas mesmas com o dispêndio financeiro...
Seriam convidadas para o casamento todas as pessoas ilustres da cidade e a casa da querida   madrasta  deveria fazer jus às enteadas ricas.

Assim que num dia aprazado , as enteadas,  foram à casa de D. Graciosa para falar desse plano...  D. Graciosa aceitou a cordialidade e generosidade das enteadas...
Transferiu-se para a casa de uma delas e se iniciou a reforma.

A casa foi  toda reformada, pintada, ficou como nova. As enteadas  compraram objetos de uso pessoal, utensílios, roupas de cama e banho, mobílias novas, etc...

O Piano de D. Graciosa era antigo e tinha um som  espetacular, que ela herdou de sua mãe pianista... O carinho de  D. Graciosa pelo seu piano era o mesmo carinho dela para com os galos, patos e  galinhas, que perambulavam alegremente  pela casa dela, antes da reforma.

O quintal foi estruturado, galinheiro com  poleiros para os galos, galinhas e pintainhos. Chiqueiro para os porcos e porquinhos, um cercado com lagoinha para os patos e patinhos... um luxo, de quintal e de casa para D. Graciosa.

A festa de casamento foi um sucesso com buffet e tudo que a noiva tinha direito e muito mais e o casal feliz, voltou para o Rio de Janeiro onde moraria e teria lá os seus filhos, netinhos para D. Graciosa.

Mas D. Graciosa, tinha arraigado em si, seus hábitos e costumes domiciliares...

Liberou o galinheiro, o poleiro, o chiqueiro e escancarou as portas  de sua nova copa- cozinha para seus companheiros e amigos animais...

Num sábado a tarde, convidei  a galerinha e  subimos no pé de manga rosa .


Constatamos que a casa estava linda, mas para  nossa frustração,  D Graciosa e seus companheiros animais, lá estavam – na sujeira -  tranquilos, como se nada tivesse acontecido...

Criança ainda naquela época,  guardei na memória tudo o que aqui escrevi, e não sem recordar as lembranças maravilhosas da minha infância...

Quando  adulta,  cheguei à conclusão de que o importante na vida é ser feliz! É  amar e perdoar as ofensas ... Não importa as circunstâncias onde nos encontremos,  e que antes de julgar os outros, devemos olhar para nós mesmos e perguntarmo-nos: Eu sou feliz?

A felicidade está em mim, como está em você.  É o mesmo Deus, que tudo realiza em nós, distribuindo a cada um de nós, os seus dons, conforme a sua vontade, nos diz  São Paulo em 1 Cor 12,11.

Cada um de nós , é especial para o Senhor: eu, você, D. Graciosa...
Mesmo que ainda  não O conheçamos, mesmo que não tenhamos intimidade com Ele, Ele nos fez indivíduos, únicos, filhos muito amados e queridos!

A Regra de Ouro para a felicidade é muito simples, porém profunda:  “Tudo aquilo, portanto, que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles, pois esta é a Lei...”, disse-nos Jesus, o filho amado de Deus.   Mateus 7,12 .

                Conhece a música desta letra? Então, cante comigo:
                 “  Eu sou feliz porque meu Cristo quer (bis).
                     Felicidade não é coisa qualquer:
                     Eu sou feliz porque meu Cristo quer! ”


Brasília, 10 de junho de 2014
Ana Miranda Bessa e Djalmir Bessa



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