30.11.14

COITÉ - CAPÍTULO IV

                                                     

                                                                                                              
              CREUSANTINA, UMA HEROÍNA ANÔNIMA-2


Dai para frente o seu pai ensinou-a, a seu pedido , a manusear um facão, bem amolado, que usava constantemente na cintura. Também aprendera a atirar com uma pequena espingarda, de carregar pela boca. 
A garrucha de dois canos que ela herdou do seu pai, quando veio a falecer, passou a usa-la escondida debaixo da roupa. Mas que roupa?

A roupa que nossa heroína passou a adotar, era usar uma calça de homem com um vestido por cima.

Aprendeu com destreza a cavalgar o jegue da família, o Teimoso . Montava igual aos homens , isto é com as pernas abertas sobre a sela fixa no lombo do animal. Nada de sela especial para mulher que só provocava desequilíbrio se o animal passarinhasse assustado com algum bicho . Enfim, estava preparada, para viver a vida difícil por aquelas bandas.

Mas com toda valentia e independência, não tinha gestos nem trejeitos masculinos. Ao contrario era uma morena bonita e muito feminina, cabelos cacheados, sempre sorridente com os dentes perfeitos.

 Neste momento que conto esta estória ela estava com  17 anos. Não quisera ainda casar nem ajuntar com o Damião a quem amava muito. Queria estar junto com seus pais para dar assistência e cuidar deles como uma filha dedicada.

 Era dócil com quem era dócil com ela. Sorridente nas horas certas,  corajosa e séria nas horas incertas.

Mas e o Damião que estava apaixonado por ela e ela por ele?  Era amor antigo... Desde o tempo da escola, se é que poderia chamar escola, que a voluntaria e dedicada Professora Romana ministrava português, matemática e outros pequenos conhecimentos  de história e geografia ,aos poucos alunos com coragem para frequentar tais ensinamentos. Portanto ambos sabiam ler e escrever.

Após o falecimento de seu pai, a doença de sua mãe piorou. Não sabia o que poderia ser essa tal doença. Desconfiava que era o coração. Numa certa madrugada sua querida mãe a chamou. Atendeu de imediato, ajoelhando-se perto da rede onde sua mãe deitava. Escutou a voz de sua  mãe muito baixinho:

Filha minha: acho que estou morrendo. Em nome do Senhor Jesus , acende uma vela e coloque nas minhas mãos ! Mal colocou a vela acesa nas mãos de sua mãe, ela virou o rosto em direção de uma imagem de Nossa Senhora da Conceição e dando um longo suspiro faleceu!

Era muito comum quando alguém da família falecia, principalmente as mulheres, aprontarem  uma gritaria. Tanto na hora do falecimento, como na hora do sepultamento.
Mas com Creusantina era diferente. Nenhum grito nem gemido... Apenas lágrimas em abundancia escorreram pelo seu rosto.

 Ela sabia que este era o destino de todo ser vivente sobre a terra. Para sua querida mãe , como para seu estimado pai, a vida terminara, pela vontade de Deus... a vida dura aqui na terra. Encerrou-se para ambos a vida..." neste vale de lágrimas", como diz a oração de Salve Rainha.

Esperou amanhecer. Chamou as mulheres da vizinhança para ajuda-la a vestir sua mãe e pediu a alguém para chamar o Damião.
Rapidinho Damião estava presente. Abraçaram-se e ambos choraram baixinho. Passado alguns minutos, Damião refazendo-se da emoção, tomou as providências necessárias para o sepultamento, que foi realizado antes do almoço. Naquela região e época não podia esperar muito, em virtude do calor.

De retorno do cemitério, de mãos dadas e em silêncio foram para a casinha da Creusantina. Assim que chegaram e entraram, cada um foi ocupar um banquinho.
Após mais alguns minutos de silêncio Damião falou:

Minha querida e amada Creusantina. Nós dois agora, se formos morar separados, cada um em sua casinha, vamos sentir muita solidão. Há muito eu quero casar com você. Acredito que chegou a hora. Hoje só temos um ao outro. Não fica sozinha, não! Vamos juntar o que é seu e vamos para minha casa. Vamos viver juntos até o Padre chegar e então casaremos com as bençãos de Nossa Senhora da Conceição. Você aceita, minha querida?

Creusantina..., como os meus leitores já perceberam, era uma mulher que tomava decisões rápidas, mas não erradas. Amava o Damião há muito tempo e sua resposta foi pronta: aceito sim, querido Damião !

Selaram aquele compromisso com um prolongado  abraço e um beijo apaixonado. Oh, que felicidade !

Assim sem perder tempo juntaram o que podiam, o que não era muita coisa, colocaram dentro de alguns sacos e ajeitaram os mesmos em cima do jegue arriado com a sela da Creusantina. Não foi esquecido o facão, a espingarda de carregar pela boca e a poderosa garrucha de dois canos, calibre 32.

Damião ao ver aquela arma  que impunha respeito aos mais atrevidos exclamou: igualzinha a minha...!

Brasília-Df, 30 de novembro de 2014
Djalmir Bessa


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