29.1.15

O CAÇADOR DE LEÃO



O Comendador Joaquim Pereira da Silva era um homem rico e empreendedor, nos idos  de 1900 e qualquer coisa a mais. Estava estabelecido em Lisboa, mais precisamente no cais do porto, onde seus armazéns estavam sempre abarrotados de mercadorias, secos e molhados,  que  importava do Brasil, da  Índia, da China e também de sua produção vinícola destinada a exportação..

Muito conceituado na sociedade lisboeta, casado e pai de uma prole de herdeiros de dez filhos..Tinha muito orgulho de seu título de Comendador que recebera diretamente das mãos do governante da época Antonio de Oliveira Salazar, pelos seus inestimáveis serviços prestados à Nação Portuguesa.
Mas como disse acima o Senhor Joaquim era um homem empreendedor, de natureza irrequieta e tinha uma firme disposição de aumentar os seus negócios .

Como uns dos líderes de negociantes de Portugal, fundou com seus colegas do porto de Lisboa algumas Associações de Classe, sendo a mais destacada a Real Academia Portuguesa de Caça, que nas épocas certas promovia caça aos faisões., codornises e até javalis. Ele era um dos melhores atiradores com sua arma calibre 12 de origem austríaca de acabamento em prata com motivos campestres.Mas não estava sereno... no seu íntimo borbulhava algo que ele não sabia bem o que era....aumentar os negócios...

Numa certa manhã  enquanto sentado à beira da cama, coçando a sua barba e alisando o seu bigode deu-lhe um estalo e pensou consigo mesmo: vou para a África, ou melhor para Moçambique, tentar aumentar os meus negócios e........caçar algumas feras.....

Dito e feito.  Comunicou tal empreendimento somente á sua cansada e esgotada esposa, pois  ela tinha dado à luz 10 filhos, três homens e sete mulheres que lhe tomavam todo  o tempo, pois ela era uma dedicada e atenciosa esposa, não medindo esforços para manter   a família, alimentada, limpa e apresentável.

Como foi dito, o Comendador Joaquim Pereira da Silva, preparou às escondidas a sua viagem à Moçambique. Não queria despertar nos colegas do ramo  invejas nem tampouco iniciar uma concorrência que poderia ser desastrosa para os seus sonhos de aumentar os seus negócios.

Levou na sua bagagem um nova arma especial para caçar feras e quem sabe até elefantes.
Uma Winchester calibre 44. Sim, essa poderia matar felinos de qualquer porte, até leões. Assim que desembarcou em Moçambique manteve contatos com comerciantes , muito deles portugueses e fez excelentes negócios, principalmente com seus vinhos de qualidade indiscutível e açúcar mascavo brasileiro.
Bem, e agora , vamos às feras.

 Aconselhado por um dos seus compradores contratou
um guia nativo Bantu, de nome Kisuba, valente caçador e conhecedor da região  e se deslocaram até a região de caça com uma bem montada comitiva onde armaram o acampamento.

Na manhã seguinte devidamente preparados, Comendador Joaquim com sua Winchester 44 adentraram a savana.


 Logo o Comendador se afastou do grupo, ansioso que era. Foi quando inesperadamente saindo de traz de uma moita um enorme leão, com uma imensa juba negra, dando um urro fenomenal partiu para o ataque. Comendador Joaquim não perdeu a calma e com um tiro certeiro no meio da testa abateu a fera, que caiu aos seus pés.

Foi uma festa no acampamento. A pele do leão foi separada e preparada para que o Comendador voltasse com a mesma e pudesse apresenta-la como troféu.

Bem, retornando a Lisboa o Comendador, muito orgulhoso de seu feito, convocou uma assembleia da Real Academia Portuguesa de Caça para relatar o sua aventura e expor  não somente a sua Winchester, como também o troféu assustador : a  pele do enorme leão de juba negra, com sua bocarra aberta mostrando suas enormes presas.

O Comendador Joaquim preparou-se bastante para o seu relatório, e querendo impressionar ainda mais a assembleia treinou incansavelmente o urro poderoso do leão, com sua voz de barítono não esquecendo-se do diafragma, para que o urro leonino saísse perfeito e pudesse assustar, sim, assustar, as “ raparigas “ e suas mamães.

No dia aprazado, o salão de conferência completamente cheio, as madames e suas “raparigas” elegantemente vestidas, os homens nos seus melhores ternos, todos com a
atenção voltadas para o Comendador, que na frente de todos relatava o feito grandioso.

Quando chegou a hora do urro do leão o Comendador fez uma pausa de alguns segundos e olhando fixamente a assembleia, com os olhos arregalados, pernas abertas, encheu seu pulmão no máximo e comprimindo o diafragma deu um urro assustador:

                         UUUHHUHUHUUHUUOOHOHOOHOHO

Ai ficou estático, com os olhos arregalados, sem movimentar um músculo, falou :

                                                  Me borrei todo!

Silêncio completo na assembleia, As madames e as “ raparigas “ se enrubesceram, e se abanavam freneticamente com seus leques chineses. Mas o silêncio persistia, com o Comendador Joaquim Pereira da Silva totalmente imóvel no meio do salão.                                                                          

Foi quando o secretario da Real Academia Portuguesa de Caça, para salvar a situação, levantou-se e disse :

  Mas também Sr. Comendador, com um leão enorme na sua frente, urrando, o Sr.
  teria que se borrar  todo!

 Recuperando o domínio de sí, e com a maior sinceridade, o Comendador Joaquim falou:

                               Foi agora Sr. Secretário que me borrei para imitar o leão.


                                                      Brasília- DF, 29 de janeiro de 2015

                                                                    Djalmir Bessa

Nota: Essa estória já foi publicada nesse blog. Estou repetindo-a para recordar aos que já leram-na  e para aqueles que é novidade para apreciarem!


             








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